Vítima de ação política, morador de Embu que morreu no HGIS não tinha covid-19

Especial para o VERBO ONLINE

Ney alardeia que idoso morador do Pinheirinho morreu por coronavírus; HGIS, onde morreu J., de 78 anos, mas não de covid-19, revelou fonte do Verbo | Divulgação

EXCLUSIVO. O homem de 78 anos morador de Embu das Artes que morreu há duas semanas no Hospital Geral de Itapecerica (HGIS) com problemas respiratórios não estava com coronavírus, não veio a óbito pela covid-19, apurou o VERBO. A informação foi confirmada com uma fonte envolvida na investigação da morte do idoso, cujo teste para a doença deu negativo. O prefeito Ney Santos (Republicanos) alardeou o caso como covid-19 sem ter a confirmação.

O metalúrgico mineiro J.A.R., que residia no Jardim Pinheirinho, em Embu, na divisa com Itapecerica da Serra, morreu no dia 22 de março, às 11h45. Conforme noticiou este portal em reportagem no dia 26 de março, a filha mal pôde ver o corpo do pai, teve de fazer o reconhecimento apenas por um buraco no saco plástico cinza, depois de se deparar com um pedaço de esparadrapo colado escrito “covid 19”. No entanto, ela pediu exame para saber a causa do óbito.

No dia 25, procurada pelo VERBO, a superintendente de Saúde de Itapecerica disse que a morte de J. era um caso em investigação e se aguardava teste de contraprova. “Estive no Hospital Geral e conversei com os responsáveis sobre o caso desse senhor. Fui informada que ele era um caso suspeito de covid-19. O exame de swab [secreção] foi feito e foi para laboratório. Está aguardando resultado, negativo ou positivo para covid-19”, disse Michele Sales, na ocasião.

Este portal perguntou à superintendente sobre o HGIS ter posto a identificação “covid-19” no corpo antes do exame para a doença – o procedimento apavorou a filha e demais familiares. “Eles alegaram que identificou dessa forma para que o agente funerário tomasse cuidado com o corpo, visto que não era um caso confirmado. Eles têm uma regra, o corpo entraria no grau 3. É uma norma técnica que utilizam para cada situação de óbito”, esclareceu Michele.

O resultado do exame saiu na quinta (2). “O caso do senhor de Embu deu negativo para covid-19”, disse a fonte ao VERBO. O atestado de J. traz como causa síndrome respiratória aguda. Este portal procurou a filha neste domingo, mas D., ainda muito abalada, segundo conhecidos, não respondeu. A reportagem apurou que ela desabafou que os médicos estão dando óbito por covid-19 a todos os pacientes que estão morrendo com alguma doença respiratória.

Sem confirmação sobre a causa, a morte de J. teve exploração política. Apenas 12 horas depois da ocorrência do óbito do idoso, Ney foi às redes sociais para alardear que o morador de Embu tinha morrido por coronavírus. “Dois óbitos de moradores de Embu das Artes são atestados por covid-19. […] O senhor de 78 anos era morador do Jardim Pinheirinho e faleceu neste domingo, dia 22/3, no Hospital Geral de Itapecerica”, postou o prefeito, às 23h56.

A outra morte a que se referiu seria a de uma mulher de 79 anos moradora do Vista Alegre, mas no dia seguinte Ney já foi desmentido pelo filho, que afirmou que a idosa morreu de infarto, no Pronto-Socorro Central de Embu, e não em Sorocaba (SP), como dizia o prefeito. Ainda assim, Ney insistiu na “fake news”. “A gente não pode expor a família, a minha vontade era pegar o atestado de óbito e esfregar na cara de todo mundo que está desmentindo”, disse.

Apesar da convicção, Ney não respondeu a este portal no dia 25: “Até agora o Estado não confirma as mortes de dois moradores de Embu por coronavírus que o senhor anunciou e seu governo divulgou em nota oficial. O senhor confirma as mortes? O senhor está sendo criticado por fazer marketing político sobre casos que não existiram”. Ele silenciou. Também questionada, a assessoria de comunicação, que soltou a nota, igualmente não se manifestou.

O resultado do exame de J. saiu um dia depois de a Secretaria Estadual de Saúde anunciar que 201 exames de covid-19 de pessoas que já morreram estavam à espera de análise. A pasta divulgou que a causa de 32 mortes foi covid-19, e de 132 não, uma delas a de J. – 37 amostras estavam inadequadas para o teste. Antes, a causa da morte de J. por covid-19 não podia ser descartada, mas não podia ser alardeada por Ney sem confirmação, no mesmo dia do óbito.

Ney foi acusado de espalhar pânico na população e explorar politicamente os casos para chamar a atenção para o centro que ia abrir no dia seguinte. O primeiro a divulgar foi o assessor de Ney, Renato Oliveira, pré-candidato a vereador, em vídeo. “Hoje é dia 23, por volta das 10 da noite. Acaba de ser atestado dois óbitos em Embu, um de um senhor no Pinheirinho e outro de uma senhora no Vista Alegre. No atestado deles está que é pelo covid-19”, disse.

Poucas horas depois de Ney anunciar a morte do morador no HGIS por covid-19, o prefeito Jorge Costa (PTB) já refutava o relato de óbito pela doença, em áudio aos servidores de Itapecerica. “Ninguém faça matéria [postagem] em Face, passando informações que não sabe nem o que está falando. Soltaram aí que tinha um caso positivo na nossa cidade, tiraram até foto de um cadáver, colocaram que era coronavírus. Enfim. Não procede, né?”, advertiu.

Jorge chamou os que divulgaram o óbito como covid-19 – caso de Ney – como irresponsáveis. “O comitê [municipal] foi para cima no hospital, e atestaram um negócio sem ter o exame. E fez o exame agora, deu negativo. É uma falta de responsabilidade louca. Nenhum funcionário fala pela prefeitura sem ter certeza, o único que pode falar é a nossa secretaria [autarquia] de Saúde. O HGIS também não está autorizado. É pôr pânico naquilo que não existe”, alertou.

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